Uns amigos vieram visitar com vontade de explorar São Paulo, então aproveitei a disposição deles para finalmente ir ao Cepa. No caminho, tento explicar aonde vamos dizendo que a Zona Leste costumava ser dormitório de colarinhos azuis, mas gentrificou nos últimos anos, especialmente próximo às estações de metrô. Assim, a vida cultural dessas áreas passou a fazer parte do circuito de burgueses safados como a gente. Perguntam que tipo de comida serve, respondo ser hipster chique globalista, não é comida de trabalhador. O Cepa, então, expulsa os moradores tradicionais? É complexo… o chefe é nascido e criado na ZL, mas trouxe a bagagem culinária da Oscar Freire. E o preço? Costumava ser barato, já não é mais, tá até no Guia Michelin. Nova-iorquinos, eles comparam: “so it is like Queens?” “Yes!” “Ok, Anthony Bourdain.”
Como demorei a vir, todo mundo já tinha comido, postado e aprovado a entrada de atum, azeite e creme com wasabi. Eu sabia que não gostaria: carne gorda com mais duas gorduras? E creme, azeite e wasabi? Só com ajuda da Santa das Combinações Malucas. Pois a novena do Cepa tá em dia, o prato funciona muito bem, obrigado. Se for para chutar, diria que a refrescância do wasabi amarra as pontas, mas ele é suave, quase não aparece, então, não sei. Obra divina mesmo. Há também um milagre da multiplicação. Nas fotos, nunca tinha percebido que é uma montanha de atum, a quantidade justifica o preço que assusta (R$62!). Vá com amigas para dividir esse preço e essa porção.





Outra entrada famosa, o pastel de Comté, cebola e vinagre de Banyuls também funciona muito bem. Só rezem para a Santa das Combinações Malucas proteger vocês quando os franceses descobrirem essa heresia de misturar queijo da Borgonha com vinho dos Pirineus. Se bem que a Santa já está total fechada com vocês, não é desse planeta pularmos de um sashimi de atum para um pastelzão de Comté sem achar bizarro. Talvez pelas entradas serem conjuntos balanceados de sabores, o sincretismo de elementos acontece sem conflito. Fica a campanha: #CepaProNobelDaPaz
Mais conservadores, monótonos e medianos, os pratos principais não chegam a ser clichês, mas ninguém precisa de reza para combinar ancho com salada de feijão manteiguinha, ou polenta com agrião e ragu de cogumelos, ou costela de porco, creme de batata, brócolis e mostarda. A costela não está desmanchando, o ragu não chega a ter profundidade, as folhas estão machucadas e amareladas. Entendo a proposta “orgânica” e “zero desperdício”, também não quero que joguem fora, mas disfarcem num recheio de pastel ou caldo verde. É difícil defender salada assim quando pagamos R$15 num PF, imagina pagando R$70 no principal.
Só pegamos uma sobremesa, também estrela da internet: ricota, tangerina e pistache. A ricota dá frescor e acidez, a compota oferece açúcar e terpenos, o pistache entra com crocância e terrosidade. Desce mais um milhão dessas, por favor, obrigado. Enquanto tomamos café, Rick planeja um raio-x para arrancar o siso (Olavo tem razão, compensa vir ao Brasil fazer operações). “Where is the clinic?” “It’s in Brooklin.” “Oh, so now we are going to a place like Brooklyn?” “No, the neighborhood is actually called Brooklin, with an ‘i’.” “Ok. How is São Paulo’s Brooklin with an ‘i’ then?” “Nothing like Brooklyn.”
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