Sempre que estrangeiros perguntam pela culinária local, os neerlandeses sorriem amarelo, dão de ombros e respondem “não somos famosos pela culinária”. Eles se consideram um povo sem cultura gastronômica, têm dificuldade em apontar pratos típicos, dizem fazer comida sem sabor, enaltecem as culinárias estrangeiras (francesa, italiana, japonesa, tailandesa…). Mas, vamos lá, deve existir alguma coisa. Comprei pela internet a “Pequena história da cozinha neerlandesa” do Jacques Meerman esperando um livro… pequeno. Chegou um tijolo de 400 páginas que começa nos romanos e termina nos festivais hipsters dos anos 2000.
Pois bem, o “arroz com feijão” neerlandês é o AVG (aardappel, vlees en groenten, ou seja, batata, carne e vegetal) e o prato nacional é o stamppot (purê de batatas com algum vegetal, em geral, endívia ou uma Brassica como couve, chucrute, brócolis, couve-flor) servido uma linguiça ou uma almôndega e molho. Porém, os neerlandeses têm uma certa vergonha de sua culinária, acham-na rural, operária, campesina (o que é verdade, mas essa coisa de “chique”, “campesino” e “colarinho azul” são sempre arbitrários, significações, simbologias, interpretações).
Assim, o stamppot só é encontrado em restaurantes turistões “venha provar a comida local”. Neles, o purê vem frio e velho, a linguiça é uma salsicha insossa. É uma pena, há nada de errado em servir purê de batatas com linguiça, basta ser bem feito (veja o sucesso do Les Arlots em Paris). Os neerlandeses querem ser urbanos e cosmopolitas, pedir poké e burrito no aplicativo. É como se estivessem parados na década de 00, idealizando o classicismo do restaurante francês e o exótico dos orientais ocidentalizados, alheios à recente valorização (já fetichização) das culinárias locais, sazonais, voltadas aos ingredientes.


Embora o Thuis by Ladera seja turístico no sentido que atende basicamente estrangeiros que estudam e trabalham na TU Delft, o lugar e a comida não são armadilha para turista. Os bitterballen, croquetes típicos do borrel (o equivalente ao happy hour brasileiro), variam conforme o que sobrou no dia anterior. Podem vir super cogumelosos e umamentos, podem vir verdes e batatudos, mas sempre vêm com uma bela, escura e seca casquinha. O excelente, caseiro e chegue-cedo-que-sempre-acaba stamppot com linguiça ou almôndegas custa apenas €10 (!). O restaurante ainda oferece toda uma sorte de opções de vegetais e carnes, como schnitzel e o repolho roxo no suco de maçã (amo).
Aberto em 1985, o restaurante é a sala de uma casa transformada em uma taberninha escura e aconchegante. É literalmente Thuis (significa “em casa”), vó na cozinha, vô no salão, serve comida, comida para os estrangeiros procurando algum conforto num prato quente depois de ser obrigado a comer o sanduíche frio tradicional do almoço neerlandês. Caraca. É lindo, não?
Lembra um pouco a gastronomia alemã, não? Mto legal o texto!
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